Um levantamento inédito feito pela antropóloga da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Adriana Abreu Magalhães Dias, pioneira nas pesquisas sobre a ascensão da extrema-direita nos anos 2000, identificou a existência de 334 células de grupos nazistas em atividade no Brasil.
A maioria se concentra nas regiões Sul e Sudeste, mas há registros também em cidades nordestinas como Fortaleza (CE), João Pessoa (PB) e até Feira de Santana, no Centro Norte baiano. As informações são do Blog do Pichonelli, do portal Uol.
Segundo o levantamento, os grupos se dividem em até 17 movimentos, entre hitleristas, supremacistas/separatistas, de negação do Holocausto ou até mesmo três seções locais da KKK (Ku Klux Klan) – duas em Blumenau (SC) e uma em Niterói (RJ).
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O principal reduto das células é São Paulo, com 99 grupos (28 só na capital), seguido por Santa Catarina (69), Paraná (66) e Rio Grande do Sul (47).
Em estados sem registros de atividades até pouco tempo, como os do Centro-Oeste, movimentos do tipo começam a ganhar corpo. Goiás, por exemplo, já possui seis células.
O que são
As células são grupos de três a 40 pessoas com ideais e atividades comuns. No caso dos neonazistas, segundo a Safernet (associação civil de direito privado com foco na defesa dos direitos humanos na web), trata-se de grupos que promovem a intolerância com base na ideologia nazista de superioridade e pureza racial com recursos de agressão, humilhação e discriminação.
São pessoas que fabricam, comercializam, distribuem ou veiculam emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda com símbolos (como a cruz suástica) e a defesa do pensamento nazista.
A entidade é responsável, entre outras atividades, por receber denúncias e as encaminhar para as autoridades, como a Polícia Federal e o Ministério Público.
Os dados sobre a extensão desses grupos no país são parte de um levantamento ainda inédito feito por Adriana Abreu Magalhães Dias e os detalhes e números completos devem ser publicados em um livro, a ser lançado em breve.
Páginas
Em suas pesquisas, a antropóloga já identificou mais de 6,5 mil endereços eletrônicos de organizações nazistas somente em língua portuguesa (metade caiu graças às suas denúncias) e dezenas de milhares de neonazistas brasileiros em fóruns internacionais.
“Normalmente, no Brasil, as células não se conhecem, não se conectam, a não ser as grandes. São grupos de pessoas que conversam, que se reúnem, e eu localizei essas reuniões por sites na internet, blogs ou fóruns. Nenhum deles tem uma corrente única. Eles leem autores que, pelo mundo, brigam um com o outro”, explicou ela ao Blog do Pichonelli.
A finalidade dessas reuniões é diversa. “A própria leitura de textos nazistas é uma violência. Mas há também células que defendem pancadaria contra homossexuais”, afirma Dias.
Dark web
Além de antropóloga, Adriana Dias sempre trabalhou como programadora de linguagens de computação, o que deu a ela as ferramentas para identificar os grupos pela internet – sobretudo na chamada “dark web”, o submundo de conteúdos não indexados da web, onde muitos dos grupos de ódios se organizam.
Em uma entrevista ao portal da Unicamp, a pesquisadora mostrou a dimensão desses grupos, que promovem uma postagem antissemita no Twitter a cada quatro segundos.
Ela já calculou também que há uma postagem em português contra negros, pessoas com deficiência e LGBTs a cada oito segundos.
“O ódio não é de agora. Sempre houve ódio racial, de classe, de gênero. Neste momento você tem uma articulação e uma sistematização deste ódio. Uma capilarização como projeto político em muitos lugares. E é impossível remover esse ódio enquanto você não civilizar as pessoas. É um processo muito complexo porque o ódio dá um conforto para elas”, concluiu.
Correio24