Mais de uma década depois, uma fazenda doada pelo compositor Gilberto Gil ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), na zona rural de Cravolândia, a 300 km de Salvador, segue quase esquecida e sem moradores fixos, de acordo com informações publicadas pelo jornal Folha.
Segundo a publicação, a história é pouco conhecida, o sonho da pequena reforma agrária se iniciou em 2003. Simpatizante do MST, o então ministro da Cultura de Lula resolveu entregá-la aos sem-terra, na expectativa de um renascimento da propriedade. A experiência campesina de Gil deve-se à amizade com o designer Rogério Duarte (1939-2016), do grupo da Tropicália.
A fazenda fica em região próxima à Palestina, um antigo latifúndio exportador de café que se transformou num assentamento de 4,3 mil hectares, onde vivem 180 famílias desde 1999, de acordo com o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Os frequentadores de um bar do vilarejo ainda chamam a propriedade da vizinhança, doada ao MST, como “a fazenda de Gilberto Gil”, a 30 minutos de carro do centro da cidade.
Líderes do MST na Bahia, Márcio Matos e o representante estadual da direção do movimento, Evanildo Costa, evitaram falar com a reportagem, depois do primeiro contato telefônico. O deputado federal Valmir Assunção (PT), político formado no MST que acompanhou a conversa para a doação, não respondeu ao pedido de entrevista.
Em mensagem por e-mail, o MST baiano admite a inércia: “De acordo com a direção do MST no Estado, a área doada por Gilberto Gil não comporta um assentamento de reforma agrária, as informações que temos apontam que o sítio possui entre 40 a 70 hectares. Esse processo pode ser confirmado com o Incra, órgão responsável pelo processo de desapropriação. Além disso, existem diversas dificuldades de acesso, tendo em vista que historicamente não houve investimentos em infraestrutura”.
“O MST até então, por conta destas questões e das demandas emergenciais do dia a dia, até o exato momento, não fez um investimento maior na propriedade, não havendo moradores fixos na localidade”, relata.
A superintendência do Incra no Estado informa que Gilberto Gil “pode fazer doações de áreas rurais a associações de agricultores e pessoas físicas, mas ao Incra não há nenhum processo em questão”. E detalha: uma área de 70 hectares, em Cravolândia, é considerada “uma pequena propriedade” (na cidade, cada módulo fiscal possui 35 hectares). A legislação do Incra “determina que a criação de assentamentos só seja realizada para assentar, no mínimo, 15 famílias”.
Na sede do MST, em Salvador, a integrante da secretaria estadual, Edineia Santana, justificou a ausência de ações: “Nos últimos dez anos, vieram outras prioridades. Como é uma terra conquistada, o processo precisa ser retomado”. Apesar da promessa, não foi apresentada a documentação com os dados da propriedade rural. O MST pensa na ideia de uma “área experimental” de agricultura.
“Muita gente quer terra, e esta aí fica sem ninguém. A fazenda tem o mais importante: água”, ressaltou o agricultor Florisvaldo, que conhece pouco a obra de Gilberto Gil e não rejeitaria um pedaço do paraíso.