Além de informações sobre o trânsito, em um futuro não muito distante será possível decidir o melhor trajeto e horário para se deslocar de carro em cidades como São Paulo com base em dados da qualidade do ar. Por meio de estudos apoiados pela FAPESP (projetos 16/18438-0, 16/14501-0 e 20/08505-8), pesquisadores do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) e da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP) estão elaborando mapas que indicam as regiões da cidade com maiores índices de poluição e os períodos de pico de emissão.
Alguns dos resultados dos projetos foram apresentados durante um painel de apresentação de oportunidades de estudos sobre cidades inteligentes realizado nesta terça-feira (09/04), na abertura da FAPESP Week Illinois, em Chicago (Estados Unidos).
Realizado pela FAPESP em parceria com o Sistema de Universidades de Illinois (UIS, na sigla em inglês) – formado pelas universidades de Illinois em Chicago, em Urbana-Champaign e em Springfield – na sede do Discovery Partners Institute, em Chicago, o encontro tem o objetivo de criar oportunidades de cooperação científica e tecnológica entre pesquisadores do Estado de São Paulo e do centro-oeste norte-americano.
O evento reúne pesquisadores vinculados a universidades e instituições de pesquisa no Estado de São Paulo, do UIS, da região dos Grandes Lagos da América do Norte – localizada na fronteira entre os Estados Unidos e o Canadá – e de instituições parceiras do Canadá e do México.
Entre as áreas de atuação dos participantes estão saúde e medicina, agricultura inteligente, clima, bioenergia, investimentos em instituições democráticas e cidades inteligentes.
“As cidades inteligentes usam tecnologias de informação inovadoras para coletar dados que são usados para construir e operar sistemas urbanos conectados com o objetivo de melhorar a eficiência e aumentar a sustentabilidade e a resiliência”, disse Teresa Córdova, diretora do Great Cities Institute, da Universidade de Illinois em Chicago.
De acordo com a pesquisadora, algumas tecnologias-chave que estão impulsionando o desenvolvimento de soluções voltadas a tornar as cidades em diferentes partes do mundo mais inteligentes são a fibra óptica, sensores de sinais de rádio e de frequências de telefones celulares.
Em São Paulo, por exemplo, por meio de equipamentos portáteis, como contadores de partículas a laser e aparelhos de GPS instalados em carros, pesquisadores do IAG e da FSP-USP estão medindo e obtendo dados georreferenciados da concentração de material particulado a que motoristas e passageiros estão expostos na cidade em diferentes trajetos e horários.
“Com base nos dados coletados durante esses estudos conseguimos construir mapas e identificar quais regiões da cidade têm maior concentração de poluentes”, contou à Agência FAPESP Thiago Nogueira, professor da FSP-USP.
Os pesquisadores realizaram um estudo em que avaliaram a exposição a poluentes atmosféricos durante deslocamentos por meio de diferentes tipos de transporte em São Paulo – incluindo carro, ônibus, metrô e bicicleta – e regiões da cidade. Os resultados revelaram que os moradores da região oeste da capital estão expostos a uma concentração maior de um poluente atmosférico chamado carbono negro. Já as com melhores condições de qualidade do ar foram aquelas que apresentavam maior concentração de áreas verdes. Em contrapartida, as regiões com qualidade intermediária do ar tinham maior presença de edifícios altos.
“Vimos que os prédios altos desfavorecem a dispersão da poluição do ar”, disse Nogueira.
Por meio de um projeto internacional, os pesquisadores também mediram os níveis de exposição a material particulado em dez cidades globais, incluindo São Paulo. Os resultados do estudo indicaram que a exposição aos poluentes fora do horário de pico de trânsito foi 40% menor pela manhã e 91% menos durante a noite. Os maiores índices de exposição a altas concentrações de material particulado foram registrados em situações em que o carro estava com as janelas abertas.
Outra constatação feita por meio do estudo foi que os motoristas e passageiros de ônibus em São Paulo estão expostos a níveis mais altos de poluentes atmosféricos do que os usuários de carro e de metrô. Os níveis de exposição atmosférica nos meios de transporte em São Paulo, contudo, foram menores do que os registrados nas outras nove cidades participantes, localizadas na África, Ásia e na América do Sul (leia mais em: agencia.fapesp.br/36652).
“Apesar da cultura de que São Paulo é uma cidade muito poluída, na comparação com outros países observamos que os níveis de exposição a material particulado na capital paulista são mais baixos”, afirmou Nogueira.
Algumas das razões para essa diferença são que os combustíveis utilizados no Brasil para abastecer os veículos são mais limpos em comparação aos adotados nos países das outras nove cidades participantes. Além disso, a matriz energética brasileira tem maior participação de fontes renováveis, explicou Nogueira.
“Também temos no Brasil o Proconve [Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores], que vem, a cada etapa, estabelecendo a exigência do uso de combustíveis mais limpos e motores mais eficientes no país”, disse Nogueira.
Desigualdade no acesso
Atualmente, 70% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no mundo são provenientes das cidades, sendo que quase a metade é originada dos transportes urbanos, em maior parte, pelos carros de transporte privativo, sublinhou Mariana Giannotti, professora da Escola Politécnica da USP (Poli-USP) e coordenadora de transferência tecnológica do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP. “Nesse sentido, o transporte público representa uma ótima estratégia para enfrentar questões relacionadas à sustentabilidade”, avaliou a pesquisadora durante palestra no evento.
Por meio de um estudo realizado no âmbito do CEM, a pesquisadora e colaboradores compararam o acesso ao transporte público em São Paulo, Nova York e Londres com base no tempo de viagem dos usuários e no custo das passagens. Os resultados indicam que Nova York possui uma política de integração que é justa e contribui para aliviar a desigualdade no acesso ao transporte público da população. Já em São Paulo a situação é diferente, comparou Giannotti.
“Em São Paulo, a desigualdade está sendo reforçada pela forma como é cobrada a tarifa dos usuários de transporte público. Normalmente, as pessoas gastam, em média, entre 20% e 40% de sua renda na cidade com essa finalidade, enquanto os moradores de Nova York despendem entre 5% e 10%”, comparou.
Os maiores usuários de ônibus em São Paulo são pessoas de classes econômicas mais baixas, principalmente negros, disse a pesquisadora.
“As pessoas ricas, que vivem nos melhores lugares da capital paulista, têm acesso a transporte público de melhor qualidade e estão pagando menos”, comparou.
Mais informações sobre a FAPESP Week Illinois estão disponíveis em: fapesp.br/week/2024/illinois.