Lula e Bolsonaro vão ao 2º turno com diferença apertada

Por Redação
11 Min

Lula e Bolsonaro vão ao 2º turno com diferença apertada

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) vão disputar o segundo turno das eleições. A votação será no próximo dia 30 de outubro, último domingo do mês. Com 97,99% das urnas apuradas, Lula tinha 48,01% dos votos e Bolsonaro, 43,56% —diferença de quase 5 milhões de votos.

O resultado de hoje frustra expectativas petistas de vitória em turno único ou a ida ao segundo turno com grande vantagem. As pesquisas indicavam as duas possibilidades, e o candidato trabalhou por este objetivo nas duas últimas semanas. Do outro lado, o resultado é comemorado pela equipe bolsonarista, que tem quatro semanas para reverter o cenário apontado hoje.

Com a apuração, o discurso antipesquisa do presidente ganha força, e a equipe de Lula —que estava otimista— recomeça a campanha preocupada.
Otimismo exagerado no PT. Entre aliados e oponentes do PT, muitos interpretam que houve salto alto. Um exemplo é que na semana anterior à votação já havia especulação de ministros. O ex-governador do Maranhão Flávio Dino (PSB) foi cotado para ocupar a Justiça.

Oficialmente, Lula pregou pelo voto útil, encabeçou uma ofensiva pelo eleitorado de Ciro Gomes (PDT) e se posicionou contra a abstenção. Nos bastidores, a campanha endossou a campanha de "vira voto" —seja de forma orgânica, a convite da campanha ou por pressão de setores. Artistas, intelectuais, empresários e antigos opositores começaram a declarar publicamente voto no petista nas últimas semanas.

Ex-presidenciáveis, economistas e empresários se reuniram e chegaram a tirar foto fazendo "L", formando a chamada frente ampla pela democracia, com críticas ao presidente Bolsonaro. A ampla aliança levou otimismo à campanha.

Atacando sem provas. Bolsonaro passou a campanha inteira duvidando das pesquisas e criticando o sistema eleitoral e a imprensa, sem apresentar provas. Colocou o processo de contagem dos votos em dúvidas de maneira reiterada e tentou emplacar que a apuração só teria validade se confirmada pelas Forças Armadas.

Faltando quatro dias para a eleição, o PL, partido do presidente, insinuou, também sem provas, que as eleições poderiam ser manipuladas, que boletins de urnas eram passíveis de fraudes e que a cadeia de servidores, formada por terceiros, oferecia "risco substancial". O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) classificou a auditoria do partido como "falsa e mentirosa".

Nas últimas semanas, o próprio presidente divulgou um suposto percentual de votos que esperava atingir hoje —em tom de ameaça. "A gente não consegue ver outra coisa a não ser as eleições serem decididas amanhã e com uma margem superior a 60% [de votos nele]", disse na live realizada ontem. Mesmo quando liderou a apuração, Bolsonaro nunca chegou nem mesmo a 50% dos votos válidos.

Discursos divergentes
Economia, a prioridade. A estratégia da campanha de Lula no primeiro turno foi focar na economia e comparar sua gestão (2003-2010) à situação atual, do governo Bolsonaro. Nos discursos, falou sobre fome, desemprego e qualidade de vida.

Foram vários comícios do petista afirmando que, se eleito, as crianças não iam mais almoçar ovo com bolacha. Também prometeu mais acesso a lazer e bens de consumo, destacando que, quando era presidente, a classe C viajava de avião e comia picanha.

No entanto, ele não esmiuçou projetos ou ofereceu detalhes. Em nenhum momento, citou quanto pretende investir numa área e qual o resultado pretende ter em empregos criados e crescimento do PIB (Produto Interno Bruto). O petista se limitou a dizer o que havia dado certo nos seus dois mandatos —anunciando que dará certo outra vez.

Pautas conservadoras. Antes de a campanha oficial começar, a equipe de Bolsonaro tinha grandes expectativas de crescimento nas pesquisas. Prazos foram colocados para haver um empate técnico com Lula sucedido por ultrapassagem. Estas previsões não se concretizaram até a véspera da eleição.

Nas ruas e em lives, além de questionar o processo eleitoral, Bolsonaro retomou a agenda de costumes, falando de Deus e da família, citou o que chama de "avanço comunista" e dificuldades sociais da Argentina —país comandando pelo presidente Alberto Fernández, simpático a Lula.

De olho no eleitorado evangélico, colou no pastor Silas Mafaia e deu destaque à primeira-dama, Michelle Bolsonaro —que também teve o papel de suavizar a imagem do marido com o eleitorado feminino.

Segundo as pesquisas, entre as mulheres, a presença de Michelle não havia surtido o efeito desejado. Bolsonaro foi bastante criticado após puxar o coro de imbrochável no 7 de Setembro e ao atacar verbalmente a jornalista Vera Magalhães durante o debate UOL, Folha, Band e TV Cultura.

Programas sociais. O mais perto de um detalhamento do que deve fazer que Lula chegou foi falar de programas que deseja reativar. Segundo o petista, o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), criado em 2007, voltará se ele vencer este segundo turno, pois focará em grandes obras de infraestrutura. O Minha Casa Minha Vida, programa de habitação, será recriado para substituir o Casa Verde e Amarela, de Bolsonaro, sob o argumento de que o atual governo não entregou resultados.

Essa promessa serve de modelo sobre o jeito que Lula fez campanha: numa mesma cartada, renovou a lembrança de um projeto bem avaliado pela população e fez uma comparação desfavorável para Bolsonaro. Como resultado, despertou no eleitor o sentimento de que no passado era melhor.

Auxílio e combustíveis. Bolsonaro, por sua vez, jogou suas fichas no Auxílio Brasil —ampliado de R$ 400 para R$ 600, até dezembro.

A campanha de Bolsonaro admitiu que o benefício foi interpretado pelo eleitorado de baixa renda como um artifício provisório que surgiu às vésperas da corrida eleitoral —agora, o presidente promete estender o pagamento nesse mesmo valor, caso reeleito. O Datafolha indicou que Lula estava à frente entre o segmento que recebe Auxílio Brasil.

O presidente também apostou na queda dos preços dos combustíveis e na deflação dos últimos meses, ainda que o poder de compra e a qualidade de vida tenham caído e mais de 33 milhões de brasileiros estejam em situação de fome, de acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19.

Estratégias
Daqui para a frente. Apesar do clima de otimismo por ter chegado ao segundo turno —liderando grande parte da apuração— Bolsonaro precisa de um feito inédito: vencer a eleição depois de terminar o primeiro turno na vice-liderança. Isso nunca aconteceu nas eleições para a Presidência.

Os dois candidatos precisam lidar com alta rejeição —segundo Datafolha divulgado ontem, 52% dos eleitores não votam em Bolsonaro de forma nenhuma e 40%, em Lula. É um obstáculo contra o qual os dois lutam desde outras eleições.

Fora da bolha. Outro desafio para os dois é conquistar quem não votou neles. Lula diz que não vê problemas em negociar para ampliar sua base de apoio —vai procurar outros partidos, os candidatos derrotados neste primeiro turno e novos apoiadores de setores com os quais ainda não conversou.

"Nosso barco é que nem a Arca de Noé: quem quiser viver, pode entrar", disse o petista, ontem, em entrevista coletiva.

Bolsonaro tem uma equipe que ajuda a traçar as estratégias da campanha, mas, no fim, durante o primeiro turno, sempre foi o presidente que definiu o que fazer —nas próximas semanas, é isso que deve voltar a acontecer.

Para o núcleo político, por exemplo, as motociatas são ineficazes para conquistar novos votos —pois ele passeia com apoiadores. A preocupação foi passada a Bolsonaro. Ele ponderou e preferiu encerrar sua campanha com a foto para o seu "datapovo" —ou seja, com aglomeração das motos.

Violência eleitoral. Outra preocupação é que tensão na disputa eleitoral se traduziu em violência —houve briga, agressão e até assassinatos após discussões políticas.

A semana que antecedeu o primeiro turno foi marcada pela escalada de atos de violência relacionados à eleição presidencial. A polícia investiga possível motivação política em três homicídios na última semana. No mesmo período, houve ao menos outros oito episódios graves de agressões a candidatos e eleitores em meio a atos políticos na reta final das campanhas eleitorais.

Especialistas ouvidos pelo UOL veem no período eleitoral de 2022 um fenômeno de "nacionalização" de casos de agressões e até assassinatos, então restritos a disputas regionais nas urnas.

"Eleições municipais costumam ser violentas, com histórico de assassinatos em diversas regiões no país", diz o cientista político Paulo Baía. "Mas estamos vivendo a eleição presidencial mais tensa e violenta desde 1989. É um barril de pólvora que pode explodir a qualquer momento."

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