Entenda dilema moral vivido por Lula em campanha do segundo turno

Por Redação
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Entenda dilema moral vivido por Lula em campanha do segundo turno
Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação

A campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vive um dilema sobre como tratar temas espinhosos na área de costumes que têm servido de munição do presidente Jair Bolsonaro (PL) contra o petista.

De antemão, o candidato lançou uma vacina e levou à TV declarações pontuais sobre religião e, nas redes sociais, tratou de aborto e criticou "falsos profetas", em referência a Bolsonaro.

A primeira semana do segundo turno foi marcada por ataques de lado a lado em assuntos ligados à fé, maçonaria, Deus e até o Diabo.

Lula segue dizendo que não quer misturar a fé das pessoas com política, mas há a avaliação no seu comitê sobre a necessidade de rebater notícias exploradas pelos apoiadores de Bolsonaro para desgastar o ex-presidente, principalmente no eleitorado evangélico.

Por isso, nesta semana Lula gravou um vídeo, que circulou no Youtube, no qual diz ser contra o aborto. A ideia é que a peça não vá, por ora, à TV. Ele também fez peças falando sobre família e medidas de governos anteriores relacionadas à igreja.

A campanha ainda avalia divulgar uma carta aos evangélicos. Até sexta-feira (7), não havia consenso sobre o tema. Mas aliados exercem forte pressão para que Lula assuma compromissos junto ao segmento mais religioso.

Uma das orientações já estabelecidas é intensificar mutirões e o corpo a corpo com evangélicos. A diretriz ainda é mostrar como Lula pode melhorar a vida do povo, por meio da economia, e monitorar notícias falsas disseminadas com objetivo desgastar a imagem do ex-presidente.

Essas ações ocorrerão sobretudo no Sudeste. A avaliação é a de que Lula deve trabalhar para ampliar a margem de votos no Nordeste, mas os principais esforços para angariar eleitores precisam ser centrados no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.

A campanha espera contar com prefeitos de diversas cidades para realizar atos, além do esforço de deputados e governadores eleitos.

O ex-presidente passou pela primeira etapa da eleição como líder, com 48,4% dos votos ante 43,2% para Bolsonaro.

A tese da cúpula petista é que costumes e religião não podem nem serão temas centrais na campanha, mas que ataques e notícias falsas não podem ser deixados sem resposta.

Por isso, a ideia com os vídeos propagados nesta semana é que caiba ao próprio Lula "olhar no olho" do eleitor e rebater acusações do adversário.

Na sexta, o ex-presidente tocou no tema mais explicitamente pela primeira vez na propaganda de TV.

"Quero debater o Brasil, mas meu adversário prefere espalhar mentiras e fake news pela internet. Espalhe a verdade. Governei esse país durante oito anos e sempre respeitei as famílias", disse Lula.

Sancionei a lei da liberdade religiosa, a criação do Dia do Evangélico e a Marcha para Jesus. O nosso projeto é recuperar o Brasil", continuou.

A tentativa de refutar as notícias de que Lula fecharia igrejas ocorre desde o primeiro turno, em ações da campanha e em falas do petista durante comícios pelo país, mas ainda não havia chegado à TV na boca do candidato.

Em discursos em atividades nesta semana, o petista tem ressaltado que é preciso ficar atento às notícias falsas disseminadas nas redes sociais.

Nos últimos dias, a campanha distribuiu panfletos e peças online listando as medidas e rechaçando informação que circulou na internet de que Lula teria pacto com o Diabo.

Mas, diante da avaliação de que era preciso ter uma resposta mais contundente às notícias, a equipe petista subiu o tom em outras frentes.

Como mostrou a Folha, o ex-presidente gravou um vídeo em que se diz "a favor da vida" e contra o aborto. "Não só eu sou contra o aborto, como todas as mulheres que eu casei são contra o aborto", afirma o petista.

Em outro vídeo, que circulou no TikTok, Lula diz que quer conversar com todo mundo "com respeito" e que "cada um tem o direito de usar a fé" sem ser incomodado por ninguém.

"Não se deixe levar pelos falsos profetas, aqueles que falam em Deus mas você olha nos olhos deles e você nota que ele está utilizando o nome Dele em vão", afirma o petista em vídeo.

A campanha fez um diagnóstico de que uma das notícias espalhadas por apoiadores de adversários, de que Lula poderia criar banheiros unissex nas escolas, está ganhando musculatura entre eleitores.

Por isso, não está descartada uma resposta mais contundente na televisão para rebater ou ainda para rechaçar a tese de que fechará igrejas. As peças também poderão abordar a relação com a família e os filhos.

O tema, porém, é tratado com cautela pelo receio da campanha petista de ser dragada pela agenda do adversário ao tratar com mais força a pauta de costumes.

Lula ainda não se manifestou sobre a legalização das drogas, por exemplo, assunto considerado complexo.

O ex-governador do Maranhão e senador eleito, Flávio Dino (PSB), avalia que Bolsonaro tentará levar o debate para o terreno das "questões ditas morais e religiosas".

"Nós precisamos fazer esse debate, não adianta fugir, ele existe na cabeça do povo e, portanto, você tem que enfrentar. Mas ao mesmo tempo você não pode ficar refém da agenda", disse Dino.

Em meio aos embates que fogem a propostas de campanha, a equipe petista também levou na sexta à TV um trecho de uma entrevista antiga de Bolsonaro em que o presidente diz que comeria carne humana —o caso foi judicializado pela campanha bolsonarista.

A tática, justificam petistas, foi usada em reação ao que aliados de Bolsonaro fizeram no início da semana, de disseminar publicações que associavam Lula ao satanismo e o acusavam de perseguir cristãos.

Em resposta aos ataques, a esquerda desenterrou um vídeo de Bolsonaro em uma loja maçônica que teve bastante repercussão, inclusive entre evangélicos que rejeitam participantes desse grupo.

Além da guerra religiosa, a primeira semana do segundo turno foi marcada por embates sobre apoios políticos.

Lula recebeu o apoio da ex-presidenciável Simone Tebet (MDB), um endosso tímido de Ciro Gomes (PDT) e o respaldo de economistas ligados ao Plano Real que já foram críticos ao PT.

A expectativa é a de que esses apoios ajudem o petista a ganhar votos, sobretudo na classe média, que deverá ser um segmento em que a campanha irá investir.

Em outra frente, Lula se reuniu com senadores e governadores eleitos, principalmente do Nordeste. A avaliação é a de que é importante ter "máquina" neste momento, em referência a governantes que têm exposição em seus estados e cidades para fazer campanha para Lula.

O petista planeja manter a maior parte de suas atividades nos três principais colégios eleitorais (São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro), mas também deverá viajar a alguns estados do Nordeste, entre eles Bahia e Ceará. O petista deverá ainda fazer atos em estados onde candidatos de partidos aliados disputam o segundo turno. Para reduzir gastos, Lula passou a priorizar caminhadas em vez de comícios.

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