Marina Silva atirou na lama o apoio recebido pelos mais de 22 milhões de votos; e fez muito pior: confundiu propositalmente o capital político pelos interesses imediatistas. A adesão à campanha tucana foi uma clara demonstração de que a candidata derrotada do PSB não faz jus ao que chama de nova política. Sua ação foi irremediavelmente retrógrada, contra seus próprios valores e sua história pública. Aliás, Marina, que agregou do falecido Eduardo Campos um valor simbólico especial nestas eleições, flertou e travou aliança com um projeto de governo estranho à sua ideologia política.
Não há caminhos naturais para esta aliança, sobretudo pela diferença entre os perfis dos partidos e dos candidatos. É forçada e exige de Marina a adaptação a um sistema nada análogo de proposições políticas. As barganhas deram início ao diálogo logo após o final do primeiro turno. Aécio ponderou aceita-las com a complacência digna de quem anseia por uma boa parcela de votos no segundo turno. Dita adepta duma nova política que representa mudança Marina apoia Aécio em nome de poder, cargos ou prestígio e não por alteração no programa de governo tucano que certamente não acontecerá.
A Rede Sustentabilidade, através de alguns correligionários, publicou um manifesto em reação à nova adesão de Marina. Segundo eles, a ação de apoio a Aécio “destoa do projeto original” e representa um “grave erro político”. Não é preciso entender muito de política para saber que Marina Silva tem um histórico de lutas populares marcado pelo enfrentamento dos grandes interesses hegemônicos: em 1985 fundou a CUT (Central Única dos Trabalhadores) no Acre ao lado do seringueiro Chico Mendes. Naturalmente seus colaboradores esperavam a neutralidade de Marina.
Neutra, a peesebista rejeitaria a polarização entre PT e PSDB. Assumindo esta posição, corre o risco duplo de cair em contradição, negar sua ideologia histórica, atropelar o projeto de ‘nova política’ engendrado desde a idealização da Rede. De qualquer modo, o sim proferido por Marina a Aécio fundamenta um casamento arriscado, cuja separação e derrota penderão tão somente para o lado mais frágil.
Alguns jornalistas entendem que Marina decidiu apoiar o candidato tucano por vingança à candidata petista. Esta é uma análise rasa e nada política; no jogo pelo apoio eleitoral existem interesses superiores ao duelo dos candidatos, mesmo diante de afrontas que parecem ser pessoais. Na verdade foi o coordenador da campanha de Marina e porta-voz da Rede, Walter Feldman, que a aproximou da candidatura tucana. Feldman fez carreira política no PSDB. Logo, a aliança era iminente, favas contadas.
Na imprensa começa o ataque à aliança; começa também o fortalecimento da simbologia da mudança. Marina pediu revisão do programa no que dizia respeito à diminuição da maioridade penal; não houve acordo. Não haverá. Como eu citava a condição de Marina no artigo anterior sobre os destaques do primeiro turno: ‘o fôlego da metade da campanha resultou em suspiros compassados a caminho das urnas. Mas há nisso algum valor ou mesmo vitória. Os mais de 22 milhões de votos são a demonstração de que um dia a polarização possa não mais resistir’. A própria Marina, decretando sua inércia política a partir de então, alimentou o sistema polarizado que ansiou destruir.
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