Ninguém hoje em dia acredita em boas intenções de países ricos, afinal, foi justamente o ex-presidente francês Charles De Gaulle quem disse que “países não têm amigos, têm interesses”.
E o que está por trás da ocupação do Mali pela França a pedido do presidente local, Traoré, ameaçado de ter sua capital Bamako invadida por guerrilheiros islâmicos de pelo menos três grupos fundamentalistas do Deserto do Saara?
Há, na verdade, duas questões por trás da chegada das tropas francesas: uma política e outra econômica:
1) O presidente François Hollande, que foi eleito em maio de 2012, enfrenta na França uma popularidade em queda brutal, poucos meses após sua posse. Ele só tem 37% da aprovação do povo.
A montagem da Operação Serval, que pretende expulsar os fundamentalistas islâmicos do Mali, tem o sentido de movimento de peças de um jogo de xadrez para a recuperação da credibilidade do governo socialista (sic) do presidente Hollande. Ele crê que saindo-se vitorioso na África, terá, ao final, um movimento de união nacional em torno do seu nome.
O pior é que ele está certo: 80% dos franceses apóiam a intervenção, tal o horror que têm aos islamitas, que infernizam a vida dos europeus nas grandes cidades francesas, principalmente em Paris e Marselha.
Nunca esquecidos de sua derrota na Guerra da Independência da Argélia, os franceses têm uma péssima relação com qualquer coisa ligada aos fundamentalistas muçulmanos, que é quem está no norte do Mali declarando a existência de um novo país, o Azawad, proclamado em primeiro de abril de 2012 (a data, realmente, parece estar trazendo azar aos homens de turbante), um mês antes da vitória de Hollande em Paris.
2) A questão econômica é que a França tem como matriz energética o átomo (a nossa é a hidreletricidade). E uma das suas principais fontes de exploração de urânio está no Níger, levada pela empresa Aréva, a apenas 200 Km do Mali. Quer dizer, qualquer possibilidade de uma vitória islâmica no Mali, com a criação do novo país Azawad ou com a tomada do Mali inteiro por muçulmanos, é uma ameaça direta à sobrevivência energética da França.
Além disso, o próprio Mali é um abençoado território riquíssimo em urânio, diamante, fosfato, ferro, bauxita, manganês e petróleo, além de ser o terceiro maior produtor de ouro da África, logo após a África do Sul e Ghana.
Embora tenha dado a “independência” aos malineses em 1960, a França quer continuar explorando as riquezas do país, hoje disputadas com a China, país cada vez mais presente em toda a África.
O único problema do presidente francês com esta intervenção do Mali para preservar seu mandato recém conquistado e as riquezas minerais que são importantes para a França, é que o seu país não está em condições financeiras de, sozinho, manter um esforço de guerra a tantos quilômetros de casa. Por isso, pediu ajuda à União Europeia, organização que reúne 27 países europeus.
Contudo, ele não teve a solidariedade de nenhum dos outros 26, pois todos entendem que o Mali é um problema francês e a França e François Hollande são os únicos a ganhar com uma vitória sobre o Islam naquela área da África, o que é uma renomada pobreza de visão, pois o Sahara e o chamado Sahel, são portas de entrada de imigrantes ilegais, drogas e armas em toda a Europa.
Controlar esta região é geopoliticamente importante para todos os europeus. Mas, vá falar em sensatez com uma Europa que viveu milênios brigando entre si como a África hoje em dia faz com suas tribos.
A esperança, agora, é que a União Africana, que se reunirá no próximo dia 29 em Addis Abeba (capital da Etiópia), resolva mandar 5.500 soldados africanos para o Mali, afim de ajudar o esforço de guerra francês. Isto é provável, mesmo diante da miséria em que vivem os governos africanos, porque o que nenhum governante do continente pode nem ouvir falar é em movimentos separatistas, pois não há país no continente negro que não tenha grupos querendo dividí-lo, vide o que aconteceu recentemente no Sudão, com a proclamação da independência do Sudão do Sul.
Ainda veremos muito sangue jorrar…
* Tony Pacheco tem formação acadêmica em Jornalismo, Economia, Psicanálise e Radialismo.
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