Todos os dias, 37 mulheres denunciam que são vítimas de violência física na Bahia, de acordo com as estatísticas da Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA). Só para se ter uma ideia, apenas nas duas delegacias de Atendimento à Mulher (Deam) de Salvador, a média é de 23 denúncias diárias, este ano.
Mas, mesmo após denunciar, não quer dizer que o caminho será fácil. Pelo contrário. No caso da cantora Aiace Félix, que reagiu a um assédio no Rio Vermelho, no último domingo, e foi fisicamente agredida, a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) foi o primeiro lugar para onde ela foi. Mas, ao chegar lá, foi mandada embora – em direção a uma delegacia territorial.
A ordem era de que somente casos amparados pela Lei Maria da Penha fossem registrados na Deam. “As moças estavam cumprindo ordens. Elas não podiam me ajudar porque a burocracia não deixava”, disse Aiace.
Mas, segundo a delegada titular da Deam de Brotas, Heleneci Nascimento, nada disso deveria ter acontecido — nem nenhuma das dificuldades encontradas pelas mulheres vítimas de violência. Para começar, ela deveria ter sido atendida na unidade.
“A delegacia trabalha com violência doméstica. Mas qualquer mulher será atendida pela Deam. Existe uma portaria que diz que a unidade que tomar conhecimento (do crime) vai registrar. Queremos saber o motivo pelo qual essa mulher não foi atendida e (a pessoa) será responsabilizada”, afirmou.
Em nota, a Polícia Civil reforçou o posicionamento da delegada titular. A corporação destaca que, embora as Deam tenham sido criadas para atender casos de violência doméstica, “há uma recomendação aos profissionais das Deams, assim como de outras unidades territoriais, que façam o registro de ocorrências graves de violência urbana contra a mulher ou de qualquer outra natureza, se procuradas pelas vítimas”.
Coordenadora do Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher e População LGBT (Gedem), a promotora Lívia Sant’Anna diz que, após uma recomendação da Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência, editada em 2010, todas as Deam do país devem atender casos de violência de gênero. “Ela (Aiace Félix) sofreu uma violência por ser mulher, então poderia ser atendida lá”, destacou.
Ato critica sucateamento do serviço de apoio a vítimas
Um abraço coletivo para chamar a atenção das autoridades com a situação do Serviço de Atenção a Pessoas em Situação de Violência Sexual (Viver) será promovido hoje, a partir das 10h, em frente ao Instituto Médico Legal (IML). A ação é uma iniciativa da Defensoria Pública do Estado, Ministério Público, Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara Municipal e entidades sociais.
De acordo com a assessoria da Defensoria, a proposta do ato simbólico é reforçar a necessidade do serviço no atendimento às pessoas vítimas de violência sexual e defender junto à Secretaria da Segurança Pública (SSP) o fortalecimento e ampliação do Viver. Em junho, uma audiência pública debateu o tema. Segundo a Defensoria, não há profissionais para o funcionamento ideal do Viver – apenas nove dos 44 necessários para o serviço atuam na unidade do IML.
De acordo com a coordenadora do Viver, Dayse Dantas, o total necessário para atender 24 horas é de 44 funcionários, incluindo finais de semana e feriados. Para o funcionamento de hoje, em horário administrativo, ela estima que 10 ou 12 contratações sejam necessárias.
“A questão é ter um pouco de paciência para encontrar o profissional correto. É muito delicado selecionar pessoal para atender esse tipo de clientela”, comentou. Ainda segundo Dayse, já foi publicado um edital para a contratação de médicos e o serviço negocia com a Secretaria da Saúde do Estado (Sesab) a disponibilização de outros profissionais.