A polícia atribui a Lázaro Barbosa, 32, conhecido como “serial killer do DF”, uma carta na qual o autor afirmou estar “zerado” de munição.
De acordo com os investigadores, o relato feito em um papel de caderno estava em um dos bolsos do agasalho que ele vestia quando foi localizado e morto, após 20 dias de perseguição, próximo ao município de Águas Lindas de Goiás.
“Já tive dois confrontos com eles [policiais] e tô zerado de munição”, diz o manuscrito. “Cara, por favor arruma o tanto de munição de 38 [revólver] e 380 [pistola] pra mim.”
A carta é destinada a uma pessoa identificada apenas como “Jil”, a quem o autor se refere no texto como “mano velho”. A polícia tenta desvendar de que se trata.
Lázaro foi morto com 39 tiros, segundo um laudo preliminar do IML (Instituto Médico Legal) de Goiânia. Os policiais que participaram da operação, na segunda-feira (28), relataram ter feito 125 disparos. Além de pistolas, um fuzil foi usado.
Coordenador da força-tarefa que mobilizou quase três centenas de policiais, o secretário de Segurança Pública de Goiás, Rodney Miranda, afirmou que Lázaro reagiu à prisão e descarregou uma pistola 380 na direção dos agentes que o perseguiam.
O texto apreendido pela polícia prossegue: “Eu tenho 35 munições de 380 lá naquele barraco que eu tava. Vê com a – – – – – [foram feitos apenas traços] pra pegar para mim.” E ofereceu dinheiro ao interlocutor: “Eu vou te adiantar R$ 500 por esse corre”.
Para a polícia, a referência na carta a duas pessoas reforça a suspeita da existência de uma rede criminosa que o ajudava a escapar do cerco policial. As investigações para identificar os integrantes desse grupo prosseguem.
As autoridades afirmam que o fazendeiro Elmi Caetano Evangelista, 74, é um deles. Um funcionário de Evangelista disse que Lázaro dormiu pelo menos cinco noites na propriedade do fazendeiro na área rural de Girassol, distrito de Cocalzinho de Goiás.
Além de Evangelista, a polícia considera a hipótese do envolvimento de outros fazendeiros, de empresários e de políticos da região em crimes atribuídos a Lázaro, incluindo assassinatos.
O advogado Ilvan Barbosa, que defende o fazendeiro, disse à Folha que seu cliente responde até o momento a um inquérito por posse ilegal de munição e por auxiliar Lázaro a se esconder.
Afirmou que desconhece, até o momento, o conteúdo de investigação que vincule seu cliente a ações do criminoso. “Outras imputações a meu cliente, se é que elas vão existir outras, não foram trazidas aos autos para que a defesa tome ciência”, disse Barbosa.
A apuração tenta responder quem deu dinheiro ao “serial killer do DF”. Segundo a Secretaria de Segurança Pública de Goiás, o criminoso carregava R$ 4.400 no bolso quando foi emboscado e morto.
“[Esse dinheiro] É mais uma prova de que tinha gente acobertando e dificultando o trabalho das forças policiais”, afirmou o titular da pasta.
Miranda diz que, embora Lázaro tenha invadido casas em seus últimos 20 dias de vida, há indícios de que ele tenha recebido os valores de moradores da região.
Os investigadores trabalham com a hipótese de que ele cometesse crimes sob encomenda e que uma série de ocorrências em que é apontado seu envolvimento possam ter relação com disputas fundiárias.
“A questão imobiliária é uma delas. Outra linha é que ele atuava como jagunço ou segurança de algumas pessoas”, disse o secretário de Segurança Pública de Goiás.
A polícia tenta desvendar se a chacina na área rural de Ceilândia, cidade satélite do Distrito Federal, no início do mês de junho tem relação com essa rede criminosa sob investigação no entorno de Brasília.
Lázaro foi apontado como o autor do assassinato de um casal e de seus dois filhos ao invadir uma chácara próxima à cidade satélite de Brasília. Cláudio Vidal de Oliveira, 48 anos, Gustavo Vidal, 21, e Carlos Eduardo Vidal, 15, foram mortos no local.
Cleonice Andrade, 43, foi levada como refém e seu corpo foi localizado três dias depois às margens de um córrego, sem roupas. De acordo com a polícia, a vítima foi executada com um tiro na nuca.
Suspeita-se que há uma referência a esse caso na carta que a polícia afirma ter sido localizada no bolso do agasalho que Lázaro usava quando morreu.
“Fui numa fita que deu mó peteco como vc mesmo deve tá vendo. O cara tava armado e, antes de eu conseguir enquadrar a vítima, ainda conseguiu avisar uma pessoa que quando eu vi foi só os tiros”, afirma o manuscrito.
Após esse crime, foram atribuídas a Lázaro outras invasões a propriedades no DF e em Goiás. Ele baleou moradores em uma chácara e fez reféns em outra. Trocou tiros com policiais e com um funcionário de uma fazenda e roubou armas e veículos.
Além do quádruplo latrocínio (matar para roubar) em Ceilândia, é atribuída a ele uma tentativa do mesmo tipo penal em 2020, ao entrar em uma chácara em Goiás para roubar e atingir um idoso com um machado.
O fugitivo tinha condenação por duplo homicídio na Bahia. Era considerado foragido da Justiça também por crimes de estupro, roubo à mão armada e porte ilegal de arma de fogo, acusação que o levou à cadeia em 2013 no DF.
Após três anos, progrediu para o regime semiaberto e fugiu. De acordo com informação da Secretaria de Administração Penitenciária do DF, ele não retornou ao sistema após uma saída temporária.
Em 2018, Lázaro foi preso pela polícia de Goiás, mas conseguiu escapar novamente. Desde então, vinha sendo procurado pela polícia.