A Polícia Federal (PF) anexou à investigação do suposto recebimento de propina da Odebrecht pelo presidente Michel Temer quatro áudios com diálogos entre pessoas ligadas à empreiteira e o coronel João Baptista Lima Filho, amigo do emedebista, que foi citado por delatores como seu receptador financeiro.
Os arquivos que agora compõe o processo foram gravados por funcionários da Hoya Corretora de Valores, empresa do doleiro Álvaro Novis, responsável por fazer entregas de propinas da Odebrecht a políticos. A empresa gravava os telefonemas dos seus funcionários automaticamente e entregou o material aos investigadores como parte do acordo de delação premiada.
As investigações apontam que executivos da empreiteira participaram de um jantar no Palácio do Jaburu, em 2014, para acertar o repasse de R$ 10 milhões ao MDB. Do total, R$ 1,4 milhão teria sido entregue a Temer por meio do coronel Lima. O restante teria sido distribuído para outros integrantes do partido.
A PF acredita que os funcionários da corretora e o coronel utilizavam códigos em seus diálogos para se referirem às entregas de propina. No primeiro deles, o entregador de dinheiro fala sobre uma “encomenda”. Em outro, Lima reclama que o valor das “atas” estava abaixo do previsto.
Procurado por ‘O Globo’, o Palácio do Planalto disse que “não comentaria interpretações que não se baseiam em fatos; são apenas fantasias”.
Veja a transcrição dos diálogos dos áudios aos quais o site ‘O Globo’ publicou nesta segunda–feira (10):
19 de março de 2014, às 10h25 – Edimar Moreira Dantas, funcionário da Hoya Corretora de Valores, questiona se o coronel Lima está no local combinado para entrega do dinheiro:
JOÃO – Alô?
EDIMAR – Seu João?
JOÃO – Ele mesmo.
EDIMAR – Meu pessoal tá ai … o senhor já tá no local da … aquela encomenda?
JOÃO – Não! Eu tô fora. Não… nós não falamos antes. Eu tô ai com uns compromissos agora. Eu só vou estar lá na minha base por volta das 14h30. Como é que o senhor vê ai? Dá pra passar às 14:30?
EDIMAR – Eu vou ver aqui e retorno. O senhor tá longe de lá, né?
JOÃO – Estou longe. Eu tô aqui pro lado de Santo Amaro, viu? E … ai com um compromisso que eu não posso deixar de atender, viu? Então 14h30, 15 horas é que eu tô chegando lá na minha base.
EDIMAR – Então vou ver se consigo marcar para as 15 horas. Qualquer coisa…
JOÃO – O senhor faz o favor, me dá uma ligada, tá bom?
EDIMAR – Tá bom, tchau!
JOÃO – Obrigado!
19 de março de 2014, às 11h37 – Coronel Lima e Márcio José Freira do Amaral, funcionário da Hoya Corretora de Valores, combinam um novo horário para entrega do dinheiro:
JOÃO – Alô?
MÁRCIO – Senhor João?
JOÃO – Ele mesmo!
MÁRCIO – Ah, sim! Bom dia!
JOÃO- Tudo bem!
MÁRCIO – Bem. Hoje então aquela reunião foi adiada, né? Vai ser entre 3 e 5 horas. Das 15 às 17 .
JOÃO – Ok. Tô por lá nesse horário.
MÁRCIO – Tá. Só que nós temos 3 etapas dessa reunião, que vai ser 5ª e 6ª feira. Agora, 5ª e 6ª eu gos … bem, eu queria ver com o senhor se pode ser entre 10 e 12 horas, na 5ª e na 6ª?
JOÃO – Veja se vocês podem me fazer isso daí às 12 horas. Eu faço de tudo para tá às 12 horas. É possível?
MÁRCIO – De 12 … vamo marcar então de … é que tem sempre que dar um espaço de tempo, de 12 até que horas, mais ou menos?
JOÃO – 12 às 13, tudo bem?
MÁRCIO-12 às 13. Nos dois dias?
JOÃO-12 às 13. Nos dois dias
MÁRCIO – Então tá combinado
JOÃO – Combinado, um abraço!
MÁRCIO – Grande abraço, até logo!
JOÃO – Outro! Tchau!
19 de março de 2014, às 15h54 – Amaral telefona ao Coronel Lima porque, segundo a PF, ele não havia fornecido a senha combinada para recebimento do dinheiro:
JOÃO – Aló?
MARCIO – João?
JOÃO- Ele
MARCIO – É o Márcio aqui. Tudo bem?
JOÃO- Tudo bem!
MARCIO – Meu pessoal tá aí com você?
JOÃO – Tá aqui. Ok e … conforme combinamos .
MARCIO – Ah, tá. Porque eles disseram que você não sabia o nome, né?
JOÃO – Então, não houve um nome … só ficou nessa base do ok, .. e nada mais, ok e … só isso!
MARCIO – Tá. Ok! Beleza!
JOÃO – Ok, reunião confirmada, só isso!
MARCIO – Tá, muito obrigado!
JOÃO – Obrigado a você. Tchau!
MARCIO – Um abraço! Tchau!
24 de março de 2014, às 15h37 – Coronel Lima questiona a Amaral se haveria novos repasses:
JOÃO – Alô?
MÁRCIO – João?
JOÃO – Ele
MÁRCIO – Opa! Aqui é o Márcio. Tudo bom?
JOÃO – Tudo bem, Márcio
MÁRCIO – Eu recebi um recado aqui, sinceramente não tô entendendo, acho que a pessoa tá se expressando mal aqui, eu não tô entendendo. É … nós tivemos 3 reuniões: quarta, quinta e sexta. Fiz uma na quarta, fiz na quinta, e na sexta você ia demorar me pediu que entregasse ao Silva.
JOÃO -Isto, isto!
MÁRCIO – Então, as três reuniões foram concretizadas.
JOÃO – Tudo bem! Tem alguma previsão pra mais alguma coisa, ou não?
MÁRCIO – Ah, não! É .. não! Ainda não tem informação nenhuma. Mas essas 3 foi tudo certinho, né?
JOÃO – Foi.
MÁRCIO – É que o pessoal tá se expressando mal, tá fazendo uma confusão do cacete.
JOÃO – Tudo bem, tudo bem. A última, a da sexta feira, em que foi entregue ai ao Silva as atas, elas não foram iguais às atas anteriores, né? Ficou um pouco abaixo.
MÁRCIO – É! Um pouquinho abaixo, o número era quebrado.
JOÃO – Tá certo, tá certo!
MÁRCIO – Tá bom?
JOÃO – Tá entendido, então!
MARCIO-Ok!
JOÃO – Eu agradeço a tua atenção!
MARCIO – Um abração, Tchau, tchau!
JOÃO – Outro. Obrigado. Um abraço! Tchau!